a própria existência se apresenta como um cárcere anormal: não sei se minha mente é orquídea, erva-de-passarinho ou cipó-chumbo. só sei da facilidade com que me enraizo a convivências e lugares que vou conhecendo - sou a dependência de meus externos, autonomia sem voz gritada dentro da cabeça. ah, que sufoco que é não ter voz! que sufoco que é ser um peso inerte, ter meu corpo lavado pelas palavras dos outros e minhas vontades resumidas àquelas biológicas. tento encontrar, nas profundezas oceânicas de meu subconsciente, o garoto que guarda os sonhos. ele os guarda feito Pandora: em uma caixinha que carrega consigo e que não quer ser aberta. por que não quer ser aberta? este querer... será da caixa ou meu? não sei, nas profundezas escuras tudo se confunde. tudo vira nada e nada vira tudo, e eu sou um paradoxo entrando em curto. sou este pane maquinal, o mal-funcionamento de minha capacidade de colocar as coisas em prática. eu sou a teoria dos sonhos (eu sou sempre a teoria), e a busca por autodefinição em meus "eu sou". eu deveria saber que, afinal, falar em 'ser' é só estigmatizar. deveria me preocupar menos.
mas dae que aparece o engenheiro. ele avalia o mal-funcionamento, aponta alguns defeitos de fábrica e conta uma história sobre um tal 'joão-de-barro'. o engenheiro diz que nada pode fazer, que ele não tem o equipamento nem a permissão para intervir diretamente em mim. porém diz que eu deveira ser mais igual ao 'joão-de-barro' - pra que criar raízes? - dizia o engenheiro enquanto acendia um cachimbo do século passado. tragou e soltou a fumaça lentamente, admirou como a fumaça se esvaia no ar e disse que eu também deveria ser mais parecido com a fumaça - olhe bem como as moléculas se desprendem de um todo completo pra se perder na imensidão do mundo, e nem por isso elas sentem medo, não é? - dizia euforicamente - e quem sabe alguma dessas moléculas não chegue a participar de algo ainda maior do que a fumaça de meu cachimbo... quem sabe alguma delas participe do tal efeito estufa ou algo do gênero. o engenheiro ria. eu mexia os olhos, em condescendência. eu sempre condescendo.
ah, que venha a libertação! que venha o ludismo humano: rasguem meus músculos, quebrem meus ossos, libertem minha mente de toda existência estruturada fisicamente! rompam o cordão umbilical, rompam as minhas raízes! e me deem asas, ó deuses, asas para meus sonhos! (por que peço a eles? cadê meus movimentos? cadê minha vontade? será que tenho a imperatividade pra conseguir mudar? )
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